F.Gil...7News.: 01/04/17

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Uma entrevista histórica de Leonardo Boff... .


Leonardo Boff concedeu uma entrevista histórica ao jornal alemão Kölner Stadt-Anzeiger, publicada em 25 de dezembro de 2016. Segue-se a tradução que recolhi do site católico espanhol Religion Digital, em espanhol, e traduzi livremente. É preciso lê-la completa. Alguns pontos que destaco: o bastidor da colaboração entre ele e o Papa na redação da encíclica Laudato Sii; a reabilitação da Teologia da Libertação; uma concepção renovada (e ao mesmo tempo ortodoxa) da encarnação de Cristo; a história do encontro frustrado com Francisco; o isolamento dos cardeais rebelados contra o Papa; a possibilidade concreta do diaconato das mulheres e do retorno dos padres casados ​​ao ministério -no caso dos padres, Boff antevê uma experiência exatamente no Brasil, a partir de um pedido dos bispos. Por fim, uma revelação bonita: com autorização e apoio dos bispos, Boff continua a presidir a missa quando está em comunidades sem padres, mesmo casado. Depois de anos e anos de perseguição da Cúria romana e dos conservadores no Brasil, Leonardo Boff continua fiel à Igreja.

Como é a fé em um “Deus da paz” de que nos fala o Natal, em meio à discórdia que experimentamos em toda parte?

A maior parte da fé é promessa. Ernst Bloch diz: “O verdadeiro Gênesis não acontece no início, mas no final, e seu começo é quando a sociedade e a existência são radicais.” A alegria do Natal é esta promessa: a terra e as pessoas não estão condenadas eternamente a viver como nós vemos agora – todas as guerras, a violência, o fundamentalismo. A fé nos promete que, ao final, tudo vai ficar bem: que, apesar de todos os erros e contratempos teremos um bom final. O verdadeiro significado do Natal não é que “Deus se fez homem”, mas que Ele veio para nos dizer. “Você, seres humanos, pertencem a mim e quando vier a morte vocês voltarão para casa” [a mim, editor deste Caminho pra Casa, este é um trecho que causou funda emoção, pois é este mesmo o espírito que levou ao nome deste blog]

O Natal significa então que Deus vem nos buscar?

Sim. A encarnação significa que algo em nós é divino e imortal. O Divino está dentro de nós. Em Jesus, isso demonstrou-se mais claramente. Mas está em todos os homens. Em uma perspectiva evolutiva Jesus não veio do exterior ao mundo, mas cresce a partir dele. Jesus é a manifestação do divino em evolução – mas ele não é o único. O Divino também aparece em Buda, Mahatma Gandhi e outras grandes figuras religiosas.

Isso não soa muito católico.

Não diga isso. Toda a teologia franciscana da Idade Média compreendia Cristo como parte da criação, não apenas como o redentor da culpa e do pecado, que vem de fora do mundo. Encarnação é redenção, sim. Mas, acima de tudo, é uma celebração, uma divinização da criação. E outra coisa é importante no Natal: Deus aparece sob a forma de uma criança. Não como um velho de cabelos brancos e barba branca longa …

Então, como você? …

Nada disso, eu me pareço mais com Karl Marx. No que me concerne: quando nós terminamos nossas vidas e devemos responder ao juiz divino, então estamos diante de uma criança. Uma criança não condena ninguém. Uma criança que quer brincar e estar com os outros. Precisamos voltar a sublinhar este aspecto da fé. A Teologia da Libertação na América Latina, da qual você é um dos representantes proeminentes, teve uma revalorização com Francisco. Há perspectiva de uma reabilitação pessoal a você, depois de décadas de luta com o Papa João Paulo II e seu guardião supremo da fé, Joseph Ratzinger, futuro Papa Bento XVI?

Francisco é um de nós. Ele partiu do patrimônio comum da Igreja da Teologia da Libertação. E o tem expandido. Aqueles que falam dos pobres têm agora a falar da terra, porque também é saqueada e profanada. “Ouvi o grito dos pobres”, o que significa que para ouvir o grito dos animais, das florestas, ouvir a totalidade do sofrimento da criação. Toda a terra chora. Assim diz o Papa, referindo-se ao título de um de meus livros; há que se escutar o grito dos pobres e o da terra hoje. E ambos têm de ser libertados. Eu mesmo trabalhei com esta expansão da Teologia da Libertação. E isto é fundamentalmente novo na “Laudato si” … … A “eco-Encíclica” do Papa de 2015. Quanto há de Leonardo Boff em Jorge Mario Bergoglio? A encíclica pertence ao Papa. Mas muitos especialistas foram consultados.

Ele já leu seus livros?

Mais que isso. Ele me pediu material para “Laudato si”. Eu dei o meu conselho e enviei-lhe um pouco do que escrevi. E foi utilizado. Algumas pessoas me disseram que ao ler, pensaram: “isto é Boff!”. A propósito, Francisco disse: “Boff, por favor, não envie documentos diretamente para mim.”

E porque não?

Ele disse: “Porque senão os secretários da Cúria pegam eu eu não recebo… Envia tudo ao sim o embaixador argentino com quem tenho um bom relacionamento, e chegará tudo com segurança às minhas mãos.” Você tem que entender que o atual embaixador argentino para o Vaticano é um velho amigo do tempo Papa em Buenos Aires. Muitas vezes beberam mate juntos. Um dia antes da publicação da encíclica, o Papa fez me chamar para expressar sua gratidão por minha ajuda.

Um encontro pessoal com o Papa ainda está pendente?

Ele procurou a reconciliação com os principais representantes da Teologia da Libertação, Gustavo Gutiérrez, Jon Sobrino … até a mim. Eu disse a respeito de Bento, Joseph Ratzinger, “mas ele ainda está vivo!”. O Papa não retrucou. “Não”, ele disse, “sono io il Papa” – “sou eu o Papa.” Ficamos em silêncio. Assim você pode ver sua coragem e determinação.


Francisco brinca com filhos de presidiários, em Roma (2014) Por que então ele não houve a sua visita?

Recebi o convite e cheguei a desembarcar em Roma. Mas neste dia, pouco antes do Sínodo da Família, 2015, 13 cardeais – incluindo o cardeal alemão Gerhard Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé tentaram uma rebelião contra o Papa. Mandaram uma carta privada a ele, e então – maravilha das maravilhas! – ela apareceu nos jornais. O Papa ficou furioso e disse: “Boff, eu não tenho tempo agora. Tenho que acalmar as coisas antes do Sínodo Irei vê-lo em outra ocasião…”

Mas ele não conseguiu acalmar as coisas, não é?

O Papa sentiu o sopro dos ventos contrários dentro de suas próprias fileiras, especialmente dos Estados Unidos. Este cardeal Burke, Leo Burke, que agora – juntamente com o Meisner, cardeal emérito de Colônia – escreveu uma carta, é o Donald Trump da Igreja Católica (risos). Mas, ao contrário de Trump, Burke está congelado na Curia. Graças a Deus. Essas pessoas realmente acreditam que deveriam corrigir o Papa. Como se fossem acima do Papa. Isso é incomum, senão inédito na história da Igreja. Pode-se criticar o Papa, discutir com ele. Eu o fiz com bastante freqüência. Mas esses cardeais acusam publicamente o Papa de propagação de erros teológicos ou heresias – em minha opinião – o que é demasiado. É uma afronta que o próprio Papa não pode tolerar. O Papa não pode ser condenado, isso é doutrina da Igreja

Apesar de seu entusiasmo com o Papa o que acontece com as reformas da igreja, que muitos católicos esperavam de Francisco, mas que não estão realmente acontecendo? Pelo que entendi, o centro de seu interesse não é mais a Igreja, não é a atuação da Igreja, mas a sobrevivência da humanidade, o futuro da Terra. Ambos estão em perigo, e você tem que se perguntar se o cristianismo pode ajudar a superar esta grave crise da humanidade, que está sob ameaça de perecer. Francisco se preocupa com o meio ambiente, e, entretanto, ele continua sua igreja antes de uma parede?

Eu acho que, para ele, existe uma hierarquia de problemas. Quando se destrói a Terra, há uma carga enorme de novos problemas. Mas, quanto aos assuntos internos da Igreja, temos que esperar! Ainda no outro dia, o cardeal. Walte Kasper, um homem de confiança do Papa, disse que em breve haverá grandes surpresas.

O que você espera?

Quem sabe? Talvez o diaconato das mulheres. Ou a possibilidade de padres casados ​​poderem ser reintegrados ao ministério. Este é um pedido formal ao Papa feito pelos bispos brasileiros, especialmente seu amigo, o cardeal emérito brasileiro Claudio Hummes. Ouvi dizer que o Papa quer responder a este pedido com uma primeira fase experimental no Brasil. Este país tem 140 milhões de católicos e deveria ter pelo menos 100 mil sacerdotes. Mas há apenas 18 mil. Do ponto de vista institucional, é um desastre. Não é de se admirar que os fiéis migrem em massa para os evangélicos e pentecostais, que preenchem este vazio pessoal. Agora, se milhares de padres casados ​​voltarem ao exercício de suas funções novamente, seria um primeiro passo para melhorar a situação – enquanto um impulso para a Igreja Católica para resolvem o cativeiro do celibato obrigatório. Se o Papa decidir a este respeito, você também assumiria funções sacerdotais novamente, como um ex-padre franciscano? Pessoalmente, eu não preciso de uma decisão deste tipo. Não mudaria o que estou fazendo hoje, o que sempre fiz: batismo, funeral e, quando eu chego a uma comunidade sem um padre, também celebro a missa junto com as pessoas.


Carinho com o professor, dom Paulo Evaristo Arns

Uma questão alemã: isso é admissível?
Até agora, nenhum bispo que eu conheço nunca se opôs ou mesmo proibiu. Os bispos também se alegram e dizer: “As pessoas têm o direito à Eucaristia.Siga fazendo isso com tranquilidade!” Meu professor de teologia, que infelizmente morreu há poucos dias, o cardeal Paulo Evaristo Arns, por exemplo, teve um elevado grau de abertura. Ele foi muito longe: quando via padres casados nos bancos da Igreja em uma celebração, convidava-os ao altar para celebrar a Eucaristia com eles. Eu o vi dizer muitas vezes: “Você é sacerdote e continua a ser.”

Blog... Mauro Lopes!

Por que no Japão os pais pedem desculpas pelo mau comportamento dos filhos adultos.

Getty Images

Pedidos de desculpas públicos são tão comuns no Japão que são quase um clichê sobre o país. Mas, em 2016, alguns destes gestos foram controversos, especialmente quando se tratava de pais pedindo perdão pelos crimes cometidos por seus filhos já adultos. A repórter Yuzuha Oka explora o que há por trás desse fenômeno. A cultura corporativa de pedidos de desculpas é muito conhecida e enraizada no Japão. Muitos devem conhecer as shazai kaiken, as coletivas de imprensas em que executivos leem um pedido de perdão com a cabeça a baixa e curvando-se diante de jornalistas. No entanto, são menos famosos os pedidos de desculpas feitos por pais japoneses que se apresentam publicamente para assumir a responsabilidade pelos atos de seus filhos --não importa qual seja sua idade.

No fim de agosto passado, a atriz Atsuko Takahata fez um pedido de perdão bastante emotivo por seu filho de 22 anos, que havia sido preso por um suposto abuso sexual. Ele acabou liberado e não foi acusado de cometer nenhum crime, mas, antes mesmo que qualquer processo criminal tivesse início, sua mãe foi a público para dizer que assumia uma parcela da responsabilidade por qualquer ato que o rapaz pudesse ter cometido. Foi algo parecido com o pedido de desculpas feito em 2013 por Mino Monta, um apresentador de TV que até mesmo pediu demissão depois de seu filho de 31 anos ser preso por tentativa de roubo. "Tenho uma responsabilidade moral como seu pai", disse ele em uma coletiva de imprensa.

Em outro caso envolvendo celebridades, a atriz Yoshiko Mita pediu desculpas pelo filho e ficou dez meses fora do ar depois de ele ser preso em 1998. Mas esse ritual não é algo exclusivo de celebridades. Em julho, depois que 19 pessoas serem esfaqueadas em um asilo para pessoas com doenças mentais em Sagamihara, o pai do criminoso de 26 anos fez o mesmo no escritório onde trabalha. Anos antes, em 2008, quando um homem de 25 anos matou sete pessoas em um shopping lotado de Akihabara, seus pais pediram perdão em frente à casa da família. "Nosso filho cometeu um crime grave. Pedimos desculpas sinceras àqueles que foram mortos ou ficaram feridos", disseram, curvando-se diante dos fotógrafos que registravam a cena.
Responsabilidade

O pedido de desculpas dos pais japoneses está ligado à ideia de simplesmente assumir uma responsabilidade, mas também é um costume que tem sua origem na era dos samurais. Conhecida como "regra Enza", a punição de familiares de parentes de criminosos ocorria nos séculos 15 e 16 no Japão e era uma forma de um guerreiro samurai impor o poder de seu soberano sobre os camponeses. A noção de responsabilidade coletiva foi ainda mais além durante o período Edo, entre os séculos 17 e 19. Cinco residências vizinhas eram consideradas uma única unidade e tidas como responsáveis pelos impostos umas das outras --e por seus crimes. Punições eram aplicadas a toda a unidade caso alguém cometesse alguma irregularidade.

Ainda que a lei tenha sido abolida em 1868, seu legado é a ideia de que toda pessoa tem uma responsabilidade com o seken, ou o "público", diz o sociólogo Naoki Sato, professor emérito do Instituto de Tecnologia Kyushu e especialista em estudos sobre seken. Ele explica se tratar de uma noção muito particular da sociedade japonesa, na qual espera-se que as pessoas sigam uma série de regras não explícitas para viverem em harmonia. Uma delas determina que os pais de um criminoso se considerem responsáveis perante o seken mesmo quando eles próprios não fizeram nada de errado.

Indivíduos ou 'posses'? Sato também destaca que há diferenças nos relacionamentos entre pais e filhos no Japão e no Ocidente. Enquanto os pais em países ocidentais veem seus filhos como indivíduos, o especialista afirma que os pais japoneses tendem a pensar mais nos filhos como suas posses e que, por isso, devem responder pelo mau comportamento deles. De fato, é raro ouvir pais pedindo desculpas por seus filhos em outros locais do mundo. Quando dois estudantes da Universidade de Oklahoma, nos Estados Unidos, foram flagrados cantando uma música racista, um de seus pais fez um pedido de perdão público. Isso foi visto como algo tão extraordinário que o site da rede CNN publicou um artigo de opinião questionando se os pais americanos deveriam fazer isso com mais frequência.

Mas, no Japão, a pressão por pedidos de perdão pelos erros cometidos por parentes pode ser tão grande que famílias chegam a ser perseguidas pela imprensa e alvo de protestos de outros cidadãos. Em 2008, no caso do esfaqueamento em Akihabara, o irmão mais novo do autor do crime teria cometido suicídio por não aguentar essa perseguição --mesmo após se mudar e trocar de emprego diversas vezes. O recente pedido de desculpas da atriz Atsuko Takahata levou, inclusive, a um debate sobre se os pais devem ser considerados tão responsáveis assim. Quando um programa da emissora Asahi entrevistou 50 pessoas sobre o caso, 60% responderam que "era um problema do filho da atriz e não dela". Uma reação semelhante ocorreu nas redes sociais.

"Estou de saco cheio de pedidos de desculpas quando a própria pessoa não fez nada. Quero que os pais demandem que seus filhos adultos assumam essa responsabilidade ou recomecem sua criação da estaca zero", disse um participante do Twitter no Japão. Jovens japoneses certamente estão mais preocupados em ter o controle de suas vidas, mas a cultura do shazai kaiken e de assumir a responsabilidade perante o público são muito enraizadas nessa sociedade. Por isso, novos pedidos de perdão ainda devem acontecer no futuro.

BBC/Brasil.